quinta-feira, 6 de março de 2008

Aula de 06 de março de 2008

Tema 5: Direitos Constitucionais (parte 2 de 2)

3. NACIONALIDADE

É o vínculo jurídico-político que une uma pessoa a determinado Estado Soberano. Vínculo que gera direitos, porém, também acarreta deveres.
Cidadão é aquele que está no pleno gozo de seus direitos políticos. Geralmente, cidadão é o nacional, mas o inverso nem sempre é verdadeiro, p. ex.: um indivíduo nacional preso, não é cidadão, visto estarem suspensos seus direitos políticos (art. 15, inc. III, da CF); uma criança nacional não é cidadã porque sua tenra idade não permite o exercício de direitos políticos.
Povo é o elemento humano do Estado, do país soberano. É o conjunto dos nacionais.
População é conceito demográfico, engloba nacionais e estrangeiros. Envolve todas as pessoas que estão em um território.

3.1. Formas
A nacionalidade apresenta-se de duas formas: originária e secundária.

3.1.1. Nacionalidade originária
Também denominada nacionalidade primária ou involuntária, é a nacionalidade dos natos, não dependendo de qualquer requerimento. É um direito subjetivo, potestativo, que nasce com a pessoa. É potestativo pois independe de manifestação de seu titular. Somente a CF poderá estabelecer quem são os natos.

3.1.2. Nacionalidade secundária
Também denominada nacionalidade adquirida ou voluntária, é a nacionalidade dos naturalizados, sempre dependendo de um requerimento sujeito à apreciação. Em geral, não é um direito potestativo, visto não ser automático.
A pessoa é livre para escolher sua nacionalidade, não podendo ser constrangida a mantê-la (princípio da inconstrangibilidade), podendo optar por outra, sendo aceita ou não (princípio da optabilidade).

3.2. Definição de Nato
Existem dois critérios para definir os natos: o critério do jus loci e o critério do jus sanguinis.

3.2.1. Critério jus loci
É considerado brasileiro nato aquele que nasce na República Federativa do Brasil, ainda que de pais estrangeiros, desde que nenhum deles esteja a serviço de seu país. A República Federativa do Brasil compreende o seu território nacional mais suas extensões materiais e jurídicas.
Se o estrangeiro estiver em território nacional a serviço de um terceiro país, que não o seu de origem, o filho que nascer no Brasil será brasileiro nato.

3.2.2. Critério jus sanguinis
É considerado brasileiro nato o filho de brasileiros que nascer no estrangeiro estando qualquer um dos pais a serviço da República Federativa do Brasil. Como República Federativa do Brasil entende-se a União, os Estados, os Municípios, as autarquias, as fundações públicas, as empresas públicas e as sociedades de economia mista, ou seja, o brasileiro deve estar a serviço da Administração Direta ou da Administração Indireta.
Também poderá requerer a nacionalidade o filho de pai brasileiro ou mãe brasileira nascido no estrangeiro, desde que venha a residir no Brasil e opte, em qualquer tempo, pela nacionalidade brasileira (ECR n. 3/94). É um direito subjetivo.

3.3. Naturalização
A aquisição da nacionalidade secundária pode ser expressa (ordinária ou extraordinária) ou tácita.
No Brasil, houve um período de naturalização tácita denominado Período da Grande Naturalização. Era tácita porque não dependia de qualquer requerimento do interessado. Essa regra foi instituída logo após a Proclamação da República e dispunha que todos os estrangeiros que se encontrassem no Brasil em 15.11.1889 e não optassem pela manutenção de sua nacionalidade originária, dentro de seis meses, automaticamente adquiririam a condição de brasileiro naturalizado.
Atualmente, temos apenas a hipótese de naturalização expressa, ou seja, as regras de naturalização previstas dependem de requerimento expresso do interessado. A CF/88 prevê suas formas:
a) Naturalização ordinária
É a naturalização reconhecida àqueles que apresentam um pedido comprovando ter residido no Brasil durante um ano ininterrupto, ser originário de país de língua portuguesa e que tenha idoneidade moral. Preenchidos esses requisitos, deve ser requerida ao Ministério da Justiça; a concessão ou não dessa naturalização é um poder discricionário do Executivo Federal. A pessoa não tem direito subjetivo a essa naturalização.
b) Naturalização extraordinária
Também denominada naturalização quinzenária, exige quinze anos ininterruptos de residência no Brasil. Pode ser concedida para estrangeiro de qualquer país, inclusive para os apátridas. Exige que o interessado não tenha condenação criminal, nem no Brasil e nem no exterior. Aqui há um direito subjetivo, ou seja, preenchidos os requisitos, deverá ser concedida a naturalização, não havendo discricionariedade do Executivo Federal.

3.4. Distinção entre Brasileiro Nato e Naturalizado

Somente a CF/88 pode estabelecer distinções entre brasileiros natos e naturalizados. Cargos reservados aos brasileiros natos:
· Presidente e Vice-Presidente da República;
· Presidente da Câmara dos Deputados e Presidente do Senado Federal (porque estão na linha de substituição do Presidente da República);
· Ministro do Supremo Tribunal Federal. Os demais cargos do Poder Judiciário poderão ser ocupados por brasileiros natos ou naturalizados;
· Ministro de Defesa (cargo criado pela EC n. 23/99);
· membros da Carreira Diplomática (não se impõe essa condição ao Ministro das Relações Exteriores);
· oficial das Forças Armadas;
· parte dos Conselheiros da República (art. 89, VII, da CF/88): o Conselho da República é um órgão consultivo do Presidente da República, devendo ser composto por seis brasileiros natos;
· o artigo 222 da Constituição Federal prevê que a propriedade de empresa jornalística e de radiodifusão sonora e de sons e imagens é privativa de brasileiros natos ou naturalizados há mais de dez anos, ou de pessoas jurídicas constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sede no País. O § 1.º do artigo, na redação da Emenda Constitucional 36/02 autoriza participação de estrangeiros em até 30% do capital total e do capital votante dessas empresas.

3.5. Perda da Nacionalidade
a) Cancelamento da Naturalização
O que gera o cancelamento é a prática de atividade nociva ao interesse nacional, reconhecida por sentença judicial transitada em julgado. Entende-se que a prática de atividade nociva tem pressuposto criminal (deve ser fato típico). A sentença tem efeitos ex nunc e a reaquisição ocorre se o cancelamento for desfeito em ação rescisória.
b) Aquisição voluntária e ativa de outra nacionalidade
Atinge tanto os brasileiros natos quanto os naturalizados. O instrumento que explicita a perda da nacionalidade nesta hipótese é o decreto do Presidente da República. Sucede por meio de um processo administrativo que culmina com o decreto que produz efeitos ex nunc. O que conduz à perda é a aquisição de outra nacionalidade, o decreto somente reconhecerá essa situação. A reaquisição também deve ser feita por decreto do Presidente da República.
Nem sempre a aquisição de outra nacionalidade implica a perda da nacionalidade brasileira. O Brasil, além de admitir a dupla nacionalidade, admite a múltipla nacionalidade. Em regra, a aquisição de outra nacionalidade implica a perda da nacionalidade brasileira, entretanto, há exceções:
· quando há o reconhecimento ao brasileiro pela legislação estrangeira da condição de nacional originário daquele país;
· a pessoa pode se ver obrigada a adquirir outra nacionalidade para manter sua residência naquele país, onde se encontra, ou, ainda, pode se ver obrigada a adquirir a nacionalidade estrangeira para lá poder exercer seus direitos civis (ex.: receber herança, trabalhar etc.). Como é imposição da legislação estrangeira, a pessoa não perde a nacionalidade brasileira;
· jus comunicatio: a mulher brasileira pode adquirir a nacionalidade estrangeira em razão do casamento. Em diversos países, o fato de a mulher casar com um nacional estrangeiro implica a aquisição automática da nacionalidade estrangeira (Itália, p. ex.).

4. DIREITOS POLÍTICOS

Direitos políticos são as regras que disciplinam o exercício da soberania popular (jus civitatis), ou seja, a participação nos negócios jurídicos do Estado. Naturalmente, só existem no Regime Democrático de Direito.

4.1. Regime Democrático de Direito

A divisão essencial dos regimes políticos está na contraposição das estruturas autocráticas e democráticas. Enquanto na estrutura autocrática vigora a soberania do governante (princípio do chefe), na democracia verifica-se o governo do povo (regra da maioria).
Pinto Ferreira[1] expõe dois conceitos de democracia. O primeiro, baseado nas idéias de Rousseau, dita que democracia é o regime do povo, pelo povo e para o povo. O segundo, apoiado no pensamento de Kelsen, fundamenta-se não só no voto do povo, mas também na liberdade de consciência, de culto, de religião e de trabalho. No conceito trazido por Kelsen, a democracia é uma técnica de liberdade. É quem melhor define a democracia, pois um povo sem liberdade de informação e de manifestação, ainda que vote, jamais terá um governo verdadeiramente voltado para o bem-estar da maioria.
Conforme ensina Celso Antonio Bandeira de Mello [2], “a democracia exige, para seu funcionamento, um minimum de cultura política, que é precisamente o que falta nos países apenas formalmente democráticos”. Bem leciona o mestre que, sem a consciência de cidadania (existente nos países substancialmente democráticos), o povo “é presa fácil das articulações, mobilizações e aliciamento da opinião pública, quando necessária sua adesão ou pronunciamento, graças ao controle que os setores dominantes detêm sobre a mídia, que não é senão um dos seus braços”.
É certo que a regra da maioria “é o instrumento técnico capaz de obter o grau máximo da liberdade”, conforme afirma Celso Fernandes Campilongo. Há sempre que se observar, porém, se o objetivo da maioria não foi manipulado por uma minoria dominante. Citando Platão, o Prof. Celso Fernandes enriquece o debate sobre a efetiva legitimidade da regra da maioria com a indagação do objeto da escolha, nos seguintes termos :
“Já na Grécia clássica, em famosa passagem de Protágoras, Platão esclarecia: ‘Quando a Assembléia se reúne, se a questão é de deliberar sobre construções a serem realizadas, são chamados arquitetos para deliberarem... Se se trata, ao contrário, de interesses gerais da cidade, vê-se indiferentemente levantarem-se para tomar a palavra arquitetos, ferreiros, sapateiros, mercadores,... e ninguém os reprova’. Em outras palavras: questões técnicas devem ser decididas por especialistas, questões políticas, pelos cidadãos”.
Estado de Direito é aquele em que todos estão igualmente submetidos à força das leis.
Estado Democrático de Direito é aquele que permite a efetiva participação do povo na administração da coisa pública, visando sobretudo alcançar uma sociedade livre, justa e solidária em que todos (inclusive os governantes) estão igualmente submetidos à força da lei.

4.2. Cidadão

Juridicamente, cidadão é aquele nacional que está no gozo de seus direitos políticos, sobretudo do voto. População é conceito meramente demográfico. Povo é o conjunto dos cidadãos.
Cidadania é conjunto de direitos fundamentais e de participação nos destinos do Estado. Tem sua face ativa (direito de escolher os governantes) e sua face passiva (direito de ser escolhido governante). Alguns, porém, por imposição constitucional, podem exercer a cidadania ativa (ser eleitor), mas não podem exercer a cidadania passiva (ser candidato), a exemplo dos analfabetos (art. 14, § 4.º, da CF). Alguns atributos da cidadania são adquiridos gradativamente, a exemplo da idade mínima exigida para alguém concorrer a um cargo eletivo (18 anos para Vereador, 21 anos para Deputado etc.).

4.3. O Sufrágio e o Voto


O sufrágio (do latim sufragium, apoio) representa o direito de votar e ser votado e é considerado universal quando se outorga o direito de votar a todos que preencham requisitos básicos previstos na Constituição, sem restrições derivadas de condição de raça, de fortuna, de instrução, de sexo ou de convicção religiosa.
O sufrágio restrito (qualificativo) é aquele só conferido a pessoas que preencham determinadas condições de nascimento, de fortuna etc. Pode ser restrito censitário (quando impõe restrições vinculadas à capacidade econômica do eleitor – as CFs de 1891 e 1934 vedavam o voto dos mendigos) ou restrito capacitário (pela CF/67 e até a EC n. 25/85, o analfabeto não podia votar).
O sufrágio identifica um sistema no qual o voto é um dos instrumentos de deliberação.
O voto, que é personalíssimo (não pode ser exercido por procuração), pode ser direto (como determina a atual CF) ou indireto. É direto quando os eleitores escolhem seus representantes e governantes sem intermediários. É indireto quando os eleitores (denominados de 1.º grau) escolhem seus representantes ou governantes por intermédio de delegados (eleitores de 2.º grau), que participarão de um Colégio Eleitoral ou órgão semelhante.
Observe-se que há exceção ao voto direto no § 1.º do art. 81 da CF, que prevê eleição indireta para o cargo de Presidente da República se houver impedimento do Presidente e do Vice-Presidente nos dois últimos anos do mandato.
O voto é secreto para garantir a lisura das votações, inibindo a intimidação e o suborno. O voto com valor igual para todos é a aplicação do Direito Político da garantia de que todos são iguais perante a lei (cada eleitor vale um único voto – one man, one vote).
Não se confunde voto direto com democracia direta. Na verdade, a democracia direta em que os cidadãos se reúnem e exercem sem intermediários os poderes governamentais pode ser classificada como reminiscência histórica. Afinal, o tamanho dos Estados modernos e a complexidade de suas administrações já não permitem tal forma de participação (costuma-se citar como exceção alguns cantões suíços, com pequenas populações).
Os principais institutos da democracia representativa (indireta) são o voto (direito ou indireto) e o mandato político que o representante recebe.

4.4. A Iniciativa Popular, O Referendo E O Plebiscito

Os principais institutos da democracia direta (participativa) no Brasil são a iniciativa popular - 1% do eleitorado nacional (cerca de 1.080.000 eleitores no ano 2000), distribuídos por pelo menos cinco Estados-Membros, com não menos de três décimos de 1% dos eleitores de cada um deles, pode apresentar à Câmara dos Deputados um projeto de lei (complementar ou ordinária). Nos Municípios, a iniciativa popular também está restrita aos interesses locais, dependendo da assinatura de 5% dos seus eleitores.
- o referendo popular é a forma de manifestação popular pela qual o eleitor aprova ou rejeita uma atitude governamental já manifestada,ex. quando uma emenda constitucional ou um projeto de lei aprovado pelo Poder Legislativo é submetido à aprovação ou rejeição dos cidadãos antes de entrar em vigor.
- plebiscito é a consulta popular prévia pela qual os cidadãos decidem ou demostram sua posição sobre determinadas questões. A convocação de plebiscitos é de competência exclusiva do Congresso Nacional quando a questão for de interesse nacional.

4.5. Alistamento Eleitoral (Capacidade Eleitoral Ativa)

O alistamento eleitoral (integrado pela qualificação e pela inscrição) e o voto são obrigatórios para os maiores de dezoito anos. São facultativos, contudo, para o analfabeto, para os maiores de dezesseis anos (até a data do pleito, conforme prevê o art. 12 da Resolução n. 20.132/98) e menores de dezoito, bem como para os maiores de setenta anos. Em seu art. 6.º, o Código Eleitoral (Lei n. 4.737/65) também faculta o alistamento do inválido e dos que se encontram fora do país. Faculta, ainda, o voto dos enfermos, dos que se encontram fora do seu domicílio e dos servidores públicos em serviço que os impeça de votar. Conforme sustenta Joel José Cândido[3] , “o indígena, capaz de exprimir-se na língua nacional, pode se alistar, desde que portador de documento, ainda que mero registro administrativo na FUNAI”.

4.6. Condições de Elegibilidade (Capacidade Eleitoral Passiva)

São condições de elegibilidade, na forma da lei:
· a nacionalidade brasileira (observada a questão da reciprocidade, antes destacada quanto aos portugueses, e que apenas alguns cargos são privativos de brasileiros natos);
· o pleno exercício dos direitos políticos;
· o alistamento eleitoral (só pode ser votado quem pode votar, embora nem todos que votam possam ser votados – como o analfabeto e o menor de 18 e maior de 16 anos);
· o domicílio eleitoral na circunscrição (pelo prazo que a lei ordinária federal fixar e que hoje é de um ano antes do pleito, nos termos do art. 9.º da Lei n. 9.504/97);
· a filiação partidária (pelo menos um ano antes das eleições, nos termos do art. 18 da Lei Federal n. 9.096/95);
· a idade mínima de 35 anos para Presidente da República, Vice-Presidente da República e Senador; de 30 anos para Governador e Vice-Governador; de 21 anos para Deputado (Federal, Distrital ou Estadual), Prefeito, Vice-Prefeito (mandato de 4 anos – art. 98, II, da CF) e a idade mínima de 18 anos para Vereador.
A aquisição da elegibilidade, portanto, ocorre gradativamente.
Não há idade máxima limitando o acesso aos cargos eletivos.
[1] Manual de Direito Constitucional. 2.ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1992. p. 206.
[2] Revista Trimestral de Direito Público. São Paulo: Malheiros.
[3] Direito Eleitoral Brasileiro. 8.ª ed. São Paulo: Edipro, 2000. p. 93.

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